quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A BESTA-FERA TOTALITÁRIA !

Mini-Teatro
Autor: João Paulo

Quadro 1: Preparando a Cena
Descrição cênica do quadro: Personagens entram na sala de aula, e vão falando o texto enquanto arrumam as carteiras, em semi-circulo. Dentro do semi-círculo, uma cadeira, mais à frente, e outras três, mais atrás. Nas cadeiras do semi-circulo vão estar sete cadeiras (quatro ficarão vazias). Nas quatro cadeiras da frente estarão: réu, promotor, juiz e advogado de defesa. Os “jurados” usam figurino normal; juiz, promotor ou advogado, usam togas. O tempo de “construção” do cenário, deve ter o mesmo tempo dos diálogos, para os dois terminarem simultaneamente.
Diálogos do Quadro:
Personagem 1
E ai, pessoal !
Então, vamos de Teatro do Oprimido, mesmo?

Personagem 2
Não, Teatro do Oprimido, não. É dos “espremidos”. O “profe”, com esse trabalho, espremeu nossas cérebros. Aff !

Personagem 3 (rindo)
Tem “QI” esparramado pra tudo que é canto até agora...

Personagem 4
Tá, tai um “gancho” pra gente, pelo menos, tentar começar essa joça. Digaê, você que espremeu o teatro. Que raio é esse de teatro do oprimido?
Personagem 1 (rindo)
Eita, agora o melhor mesmo seria dizer como o Ratinho “borá pra frente; pula essa parte”. Mas, dado o meu alto grau zero de conhecimento dos mistérios da dramaturgia, vou tentar resumir essa bagaça. Porém, pra tanto, preciso do auxílio do QI que sobrou do esparramo geral. Com a palavra minha colega aqui, que tem mais neurônios pra decorar texto:

Colega
Sobrou pra loira! Tá, em resumo, essa história de Teatro do Oprimido, sobre o qual o colega não falou, segundo Augusto Boal, o pai da matéria, quer dizer, mais ou menos, o seguinte: “aquele que transforma as palavras em versos, transforma-se em poeta; aquele que transforma o barro em estátua, transforma-se em escultor; e ao transformar as relações sociais e humanas apresentadas em uma cena de teatro, transforma-se em cidadão”
Personagem 6
Porra, meu ! (todos riem, pelo menos né)

Personagem 2
Isso é o que eu gostaria de ser..

Todos (espantados)
Ahhhhhhhhhhhhhh!

Personagem 2
Calma, gente. Acho que vocês entenderam mal. Eu to dizendo que gostaria de ser esse personagem “seis”, que até agora só disse: Porra, meu !

Personagem 3 (rindo)
Ah, bom. Pensei que gostarias de ser o produto, em si.

Personagem 4
Bom, mas voltando às vacas magras. Ou melhor: recompondo a cena. Vamos usar, então, a técnica do Teatro do Oprimido, é isso?

Personagem 5
Olha, gente, é bastante complexa essa história de teatro do oprimido, mas dado ao tema proposto (Estado Totalitário), vamos ter que vender esse peixe pescando nesse poço profundo...

Personagem 2
Ave Maria !

Personagem 3
O que foi, “dois” ?

Personagem 2
Tá explicado agora porque o “cinco” não tinha falado ainda... Pensei que era esquecimento do autor. Mas, não. É que, dizem, que os mais inteligentes escutam mais, e falam menos.

Personagem 5
Ok, menos, Batista! Mas, só pra contextualizar, e pra não ficar conversa de doido com maluco em dia de festa das bruxas em manicômio.

Personagem 1
Aí, é a treva !

Personagem 5
Teatro do Oprimido é um método teatral que reúne Exercícios, Jogos e Técnicas Teatrais elaboradas pelo teatrólogo brasileiro Augusto Boal.

Personagem 2
Aí, é o Google !

Personagem 3
É Wikipédia, pura !

Personagem 4
Deixem o “cinco” exercitar sua sapiência, gente !

Personagem 5
Esse tal de Boal, figurinha carimbada dos anos sessenta e setenta, fazia teatro pras Ligas Camponesas, na época da Ditadura.

Colega
Ah, eu li sobre isso. Dizem que após um espetáculo, um camponês convidou o grupo dele para uma ação contra uns jagunços de uns fazendeiros, e eles pipocaram.

Personagem 5
Pois é. Ai, o Boal, que sacava rápido as coisas, pensou: estamos incentivando os sem terra a lutarem, e não lutamos. Então, algo precisa ser feito...E aí nasceu o teatro do Diálogo, e não o teatro do Monólogo.

Personagem 6 (rindo)
Então, o “profe” que nos aguarde...!

Corta (Desce Luz na Preparação da Cena; Sobe Luz no Tribunal )

Quadro 2 – Tribunal do Juri
Descrição Cênica do Quadro: Uma formação de “plenário”, como se fosse um Tribunal de Juri. Cadeiras para Juiz, Advogado, Promotor, Réu e Jurados (três, apenas).

Juiz:
Em conformidade com a Lei, damos por aberta essa Sessão do Tribunal do Juri. Que adentre o Réu; a Besta-Fera Totalitária...

Besta-Fera Totalitária:
Sou inocente, Excelência !

Juiz:
Cale-se ! Que adentrem o Promotor, o Advogado de Defesa e o Corpo de Jurados.
(Entram o Promotor, o Advogado e os Jurados. Só que, ao invés de sete, entram só três: o Cego, o Surdo e o Mudo)

Juiz:
Em julgamento, nessa sessão, a Besta-Fera Totalitária, pelos crimes que seguem: Poderes concentrados, não permitindo a prática da democracia; Restrição das garantias aos direitos individuais; Sistema judiciário e legislativo, às margens do poder; Uso da força militar como forma de repressão; Proibição de eleições; Censura e Controle dos meios de comunicação; e Propaganda de exaltação da Besta-Fera Totalitária.

Promotor:
Excelência, já há provas suficientes nos autos, e na história, para condenarmos, de antemão, a Besta-Fera Totalitária, sem maiores delongas.

Advogado:
Desculpem-nos, senhores. Há um equívoco aqui da Promotoria. Excelência, com vossa permissão, eu gostaria de discorrer, brevemente, sobre os benefícios de um governo dito totalitário; expressão essa com a qual, diga-se de passagem, não concordo.

Juiz:
Dr, por “questão de ordem”, e mesmo diante da clarividência do que aqui se vê, desses que se dizem, oficialmente, Conselho de Sentença, gostaria de, pelos menos, qualificá-los perante esse Tribunal, mesmo isso não sendo uma praxe forense.

Advogado:
Pois não, Excelência!

Surdo: (tampão nos ouvidos)
Apesar de ouvir muito bem, sou surdo por conveniência. Não ouço o clamor dos oprimidos e os pedidos de justiça dos injustiçados e explorados. E esse tampão, em muito me auxilia....

Cego: (Venda nos olhos)
Tenho dois olhos, que brilham e não são defeituosos. Uso, entretanto, esta venda para nada ver e nada testemunhar com o brilho dos meus olhos omissos....

Mudo (Tirando a mordaça)
Vejam ! Tenho boca, sim. Prefiro, no entanto, usar, deliberadamente, esta mordaça. Com ela não preciso denunciar injustiças, nem apontar soluções...

Juiz:
É, pelo que vejo, porém, de nada adiantaria chamarmos mais quatro jurados; se forem a exemplos desses que ai estão. Logo, proponho que todos os senhores, e o senhor, especialmente (indicando para a “platéia”, e de forma mais incisiva para o Professor), sejam o nosso verdadeiro Conselho de Sentença.

Advogado:
A Besta, digo, o meu cliente, senhoras e senhores, é totalmente inocente dessas acusações; senão, vejamos: Concentrar poder é assegurar benefícios para o povo, evitando-se ordens divergentes; Democracia só é bonita no papel, porque na hora do voto, é um Deus-nos-Acuda; é um Salve-se Quem Puder, é um Toma-Lá-Dá-Cá. Portanto, eleição não vale a pena; só desagrega. Garantias de Direitos Individuais? Pra que? Basta que seja garantida a vontade do governo, em nome de todos. Judiciário e Legislativo, pra que, também? Pra termos juízes vendendo sentença e deputados comprando voto? Não, não. É muito mais prático um só dizer o que tem que ser feito, e pronto. Censura e repressão? Nada mais justo. Pra que deixar esses aloprados da imprensa falando o que bem entendem? E um bando de Anarquistas, sem graças a Deus, infernizando a todos com badernas nas ruas? Polícia neles! Então, os chamados democratas só querem é uma boquinha do poder. E o que dizer dos anarquistas, então? Fala sério, né. Nunca, na história desse país, se soube que o anarquismo resolveu alguma coisa...Aliás, na verdade, nunca houve, sequer, uma experiência anarquista...

Promotor:
Alto, lá, Dr. Não vou vestir a carapuça de ignorante histórico, não. Ainda mais, no caso específico. Já que foi em Santa Catarina que ocorreu, de fato, talvez, a primeira experiência anarquista da história mundial. E, se vossa excelência não sabe, foi às margens da Bahia da Babitonga, em São Francisco do Sul. Eram as colônias do Falanstério do Saí, e a Colônia do Palmital.

Personagem 2 (abandonando o formalismo do ambiente forense, e se projetando mais pra fora da cena; retomando a descontração inicial, enquanto que juiz, promotor e advogado ficam “congelados”)

Eita, que agora o bicho pegou, vai sobrar pro Bakunin e o Tolstoi.

Personagem 3 (no mesmo tom, e também se projetando pra fora da cena formal).
Bakun, quem?????

Personagem 5
Mikhail Bakunin e Leon Tolstoi, dois propagadores do movimento anarquista mundo afora, com base nas idéias de Willian Godwin, "o primeiro a formular as concepções políticas e econômicas do anarquismo”.

Personagem 6
Eita, que o “cinco” é uma Wikipédia ambulante, de braço dado com o Google.

Juiz: (juiz, promotor e advogados se “descongelando”)
Muito bem, senhor Promotor. O assunto foge dos autos, mas é pertinente, até porque, o próprio anarquismo é uma das vítimas do totalitarismo. E a abordagem até contribui para consagrar a pena máxima para o totalitarismo, que por certo virá do Conselho de Sentença.

Promotor:
É verdade, excelência. Até porque a máxima do Anarquismo é acreditar no socialismo sem ditadura, defendendo a liberdade e a abolição do Estado. Aliás, por falar em Ditadura, foi a dita cuja aqui no Brasil que massacrou também o embrião do movimento anarquista nacional.

Advogado
Mas, excelência, retomando aos autos: aqui não há crime algum a ser julgado. E, em não havendo, peço a absolvição da Best..., digo, do meu cliente.

Corte (Desce Luz em Julgamento; Sobe Luz em Sentença)

Quadro 3 – Sentença Final
Descrição Cênica do Quadro: Juiz,levantando-se de sua cadeira, vai até o professor, e o conduz ao centro do “plenário”.

Juiz:
Nesse Tribunal, uma vez mais o Conselho de Sentença fez o seu julgamento. Antes, porém, da leitura da sentença final, esse juízo quer ouvir a confirmação dos malefícios do Totalitarismo, e a sua evolução histórica, e a versão de Estado, segundo os Anarquistas. Trinta segundos, para a abordagem do professor .......................mentor desse processo.

Personagem 1 (voltando a descontração inicial, se sobressai do grupo, dando um passo à frente, e virando-se para a platéia, diz:)

Aff ! Agora é o “Se vira nos trinta”. A vingança maligna de Augusto Boal...

Professor: (trinta segundos - Resume historicamente os regimes totalitários e anarquistas)

Juiz: (Voltando à sua cadeira)
Neste Tribunal, onde imperam a lei e a justiça, o Conselho de Sentença fez seu julgamento, e por unanimidade de votos, sopesada as provas, houve por bem condenar o réu à pena máxima: a decapitação da fera...

Coro (todos, abaixam a cabeça, inclusive o juiz, e falam o texto em tom de ladainha)
Aí dos que fazem do poder absoluto, o seu Deus, o seu Senhor; e bebem sem piedade o sangue do povo sofredor. Conduzido a juízo, num julgamento preciso, perderá o paraíso, que por muito tempo foi templo explorador. O poder só tem sentido, quando o clamor do oprimido é prontamente atendido contra as garras da opressão. Queremos só a justiça, queremos só a verdade, que a lei jamais seja omissa, venha a nós a Liberdade...Amém !
A BESTA-FERA TOTALITÁRIA
Criação: João Paulo

Pastor (alguém que sai do coro, já com “figurino de pastor”)
... e vi levantar-se do mar uma Besta, que tinha sete cabeças e dez cornos, e sobre os seus cornos dez diademas e sobre estes, nomes de blasfêmia...!

Música:
(Música cantada por todos, com auxílio de aparelho de som, enquanto o grupo vai recompondo as carteiras em seus respectivos lugares, desfazendo o “Tribunal do Juri”).

Quando um muro separa, uma ponte une... Se a vingança encara, o remorso pune...Você vem e me agarra, alguém vem e me solta... Você vai na marra, e um dia volta.. E se a força é sua, ela um dia é nossa... Olha o muro, olha a ponte, olha o dia de ontem chegando, que medo você tem de nós....Você corta um verso, eu escrevo outro...Você me prende vivo, eu escapo morto...De repente olha eu de novo, perturbando a paz, exigindo o troco... O muro caiu, olha a ponte da liberdade guardiã, no braço do Cristo horizonte, abraço do dia de amanhã, olha aí....


Fim !

Um comentário:

  1. Mini-Teataro escrito especialmente para uma turma do Curso de Direito da UNOESC-Universidade do Oeste de Santa Catarina.

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